O pianista Nelson Freire, considerado mundialmente como um dos maiores intérpretes de Beethoven e Chopin, e detentor de inúmeros prêmios internacionais, morreu na madrugada desta segunda-feira, dia 01 de novembro, aos 77 anos, em sua residência no Rio de Janeiro. A causa da morte não foi revelada.
Freire estava sem se apresentar desde 2019, quando sofreu um acidente durante uma caminhada, fraturando o braço direito.
Mineiro de Boa Esperança, Nelson José Pinto Freire nasceu em 18 de outubro de 1944. Iniciou sua trajetória artística com apenas 3 anos de idade, quando tocou de memória peças que havia visto sua irmã mais velha executar. Dois anos depois, apresentou o seu primeiro recital, no Teatro Municipal de São João Del Rei.
O talento de Freire o levou à Europa aos 12 anos, para estudar com os melhores professores. Neste período gravou seu primeiro LP, dedicado a Chopin, o que demonstrou sua precocidade artística ímpar.
Aos 15, já realizava os seus primeiros concertos. Foi consagrado pela crítica europeia, se apresentando com as melhores orquestras do mundo, tornando-se um dos maiores intérpretes de Beethoven, e conhecido também, por interpretar Chopin.
Aos 19 anos, após uma apresentação em Nova York, foi classificado pela revista Time como “um dos maiores pianistas desta ou de qualquer outra geração”.
Humilde e extremamente dedicado, Freire era chamado por seus pares de “Reverendo Nelson”. Era talentoso, porém, extremamente perfeccionista:
“Não ouço nem durante, nem depois meus discos. Já tem uns cinco anos isso, foi acontecendo aos poucos. Porque se ouço, fico querendo mudar”, disse o pianista ao jornal O Globo, em 2001.
A partir de 2001, lançou grandes discos, como o álbum dedicado à obra de Debussy.
De acordo com o Instituto Piano Brasileiro, Nelson Freire é o único artista do país incluído no projeto “Great Pianists of the 20th Century” (Grandes pianistas do século XX), uma coleção de 200 CDs lançados pela Phillips.
Sua trajetória artística foi registrada pelo cineasta e documentarista João Moreira Salles, em 2003, no documentário “Nelson Freire”.
Em 2012, ganhou o Grammy Latino com o álbum “Brasileiro”, no qual interpretava obras de ilustres compositores, como: Villa-Lobos, Camargo Guarnieri, Lorenzo Fernandez, Henrique Oswald, Alexandre Levy, Barrozo Netto, Claudio Santoro e Francisco Mignone. Neste mesmo ano, retornou ao palco de São João Del Rei, teatro onde realizou o seu primeiro concerto, depois de 62 anos.
Em 2015, o escritor Ricardo Fiúza lançou um livro sobre a vida e obra de Nelson Freire, intitulado. “Nelson Freire: a pessoa e o artista”. O escritor e o pianista eram amigos desde os anos 50.
Em 2018, jovens da Orquestra Sinfônica da Baixada Fluminense acompanharam um ensaio do pianista no Theatro Municipal do Rio.
O pianista se apresentou em mais de 70 países e possuía uma extensa e multipremiada discografia. O último álbum, intitulado “Encores”, foi lançado pela Decca no dia do seu aniversário, em 18 de outubro de 2019, data em que completou 75 anos de vida e 70 anos de carreira.
Entre as orquestras com as quais se apresentou estão: a Filarmônica de Berlim, a Orquestra Sinfônica de Londres e a Orquestra Filarmônica de São Petersburgo.
O jornalista Mauro Ferreira, que há 34 anos escreve sobre música, ressaltou a técnica e a sensibilidade extraordinárias de Freire: “Quem ouviu e viu Nelson Freire tocando peças de compositores como Bach, Beethoven, Brahms, Chopin, Liszt, Mozart e Schumann, provavelmente ficou convencido de que o talento soberano de Nelson Freire era coisa de Deus”.
Por quase toda a sua carreira, Nelson fez parcerias com grandes pianistas, sendo uma das mais famosas, a argentina Martha Argerich, sua grande amiga e parceira artística, com quem fez várias turnês e apresentou peças de dois pianos.
Admiradores, amigos e colegas do pianista lamentaram a sua morte: “Ele encarnava valores de um humanismo essencial a todo projeto de civilização decente - a transmissão da beleza, o imperativo moral do trabalho bem feito, a recusa a toda vulgaridade e espalhafato”, disse o cineasta João Moreira Salles em depoimento ao jornal O Estado de São Paulo.
“Perdemos nosso grande pianista, um artista generoso e genial”, lamentou o diretor da Sala Cecília Meireles, João Guilherme Ripper, ao jornal O Globo.
“A morte de Freire é a extinção de uma incomum extravagância no teclado, misturada com uma rara sensibilidade e expressividade. Um monstro sagrado do piano nos deixa”, declarou a rede de rádios France Musique.
Freire deixa o companheiro, o médico Miguel Rosário, um irmão e um imenso legado para a música clássica brasileira.
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